terça-feira, 12 de julho de 2011

Vale ler de novo?

Primus scriptum
(acho que isso não existe, mas vamos lá):
Enquanto uma história nova cresce no meu coração e imaginação, apresento novamente a primeira história do Degraus - Amélie e a Escada. Ela explica um pouco o que é o blog, como ele surgiu, o que apresenta... Assim, achei que valia trazê-lo aqui novamente.
Enjoy!


Oi. Meu nome é Adriana e eu quero contar uma história.
Um dia, há alguns anos, fui ao cinema e, como não é muito raro, cheguei bastante atrasada. Comprei o ingresso e corri para o meu destino. Com o filme na cabeça, comecei a subir as escadas quando, ao olhar para cima, vi a pessoa que menos queria ver naquela época. Acho que para ele o encontro não era muito esperado também. Cruzamos nossos caminhos nos degraus, um para cima, outro para baixo, num esbarrão de ombros. Foi uma das coisas mais deprimentes que já vivenciei. Tão surreal que não parecia acontecer comigo. Talvez por isso não tenha pensado a respeito naquele momento. O foco era chegar na hora.


O filme era O Fabuloso Destino de Amélie Poulain. Amei Amélie, sua imaginação enlouquecida tão parecida com a minha e com as pessoas que adoro, seu medo de quebrar em pedaços tão parecido como o meu, sua bisbilhotice com o bem estar alheio tão familiar. Ao final do filme, em prantos - Está certo... Amélie, minha menina... Você não tem ossos de cristal como eu, pode aguentar os baques da vida. Se deixar esta oportunidade escorregar por entre teus dedos, então, o tempo vai passar e teu coração ficará tão seco e frágil quanto o meu esqueleto. Então vá em frente! Pelo amor de Deus! -, voltei à cena da escada.



E uma coisa incrível aconteceu: percebi que a ficção havia sido o encontro de ombros, bruto e grosseiro, entre duas pessoas que até pouco tempo compartilhavam seus sonhos, idéias e esperanças. Mais real e próximo era o mundo de Amélie, projetado em luz e sombras na tela da sala de cinema.  Ele não era real por ser distante, pelo contrário; ele de mim estava impressionantemente próximo.

A ficção, seja no cinema, na literatura, na música, na pintura, na fotografia não é fuga, é encontro. Reconhecimento. Momento que prezo com maior cuidado, mesmo que o cinema seja quase rotina. Esses momentos compõem a minha vida em narrativas.


A história de Amélie e a escada é a primeira delas. Outras virão. Em todas elas, eu me encontro. Espero que você também. Este espaço é tão seu quanto meu. As histórias são infinitas, mesmo após o ponto final. Se você quiser complementar uma delas, contar a sua ou até mesmo mostrar a sua insatisfação, mande sua história.  Este espaço existe também para que se possa ir além dos comentários costumeiros, que, no entanto, serão sempre queridos. Mas podem ser restritivos. E uma coisa que não pode acontecer com os filmes, para mim, é se restringir a imaginação e a vontade de contar uma história.
Sendo assim, seja bem-vindo à imaginação de Amélie. 


terça-feira, 5 de julho de 2011

Dream a little dream of me

Esta história tem dois personagens + um extra.
Os personagens são:
Brooke Elliot (ela interpreta Jane Bigun, na série para televisão Drop Dead Diva).
Oliver Platt (ele não precisa de apresentações, certo?).
O extra é totalmente anônimo (vida difícil...).

O início da história é um pouco abrupto, daí a necessidade de apresentar os personagens. Eles se encontram sem nenhuma razão, na sala da casa da mãe de Brooke.  Os dois parecem já se conhecerem de algum tempo, mas seu relacionamento é ainda indefinido.

Quando os encontramos, estão sentados no sofá.


"Você parece gostar de mim," diz Brooke, a um Oliver reticente, que a olha meio constrangido.

"Gosto. Na verdade, amo." Oliver não falou levianamente. Amava, e amava muito. Sua declaração envolveu Brooke, a sala. Transformou o ar. Transformou todos que se encontravam ali, voyeurs oníricos ou personagens do inconsciente. O sentimento era tão forte, genuíno e intenso que tomou todos os demais sentidos para si. 

Pena que Oliver tinha de continuar a falar... "Mas, sinceramente, não estou disposto a passar a minha vida com uma pessoa tão gorda".

Mesmo meio sem graça, ele não via outra alternativa à sinceridade. É como se não houvesse nenhuma possibilidade ou a chance de dizer outra coisa. O ambiente não é tenso, mas intenso. Os dois realmente se amam de verdade.


Brooke não se surpreendeu ou magoou, apesar de o seu coração apertar um pouco. Era a verdade. Estava gorda. Era gorda, aliás, sem nenhuma perspectiva de mudar. Gostava de si mesma, mas entendia Oliver. Até concordava com ele, porque não conseguia ver algo de errado no seu comentário - embora soubesse que ali havia problemas, e sérios. 

Não a entendam mal. Ela não é submissiva ou tola. O comentário de Oliver a deixou triste e pesou no seu coração. Mas ela o via para além de uma opinião. Era uma sentença, na verdade, que condenava os dois a segui-la sem contestação.

Era isso. Contestar não era uma opção.

Mesmo assim, Brooke precisou realmente se segurar para não dizer que ele não estava muito diferente. Excesso de peso por excesso de peso, Oliver não estava tão diferente dela. Mas não era esse o caminho. Por isso, mordeu a língua e ficou calada. Além do que, o que mais a dominava nesse momento era o sentimento de perda que a impossibilidade de ficarem juntos representava.

Ela se levantou e dirigiu-se ao quarto. Estava recebendo uma visita na casa que fora de sua mãe. Uma amiga chamada... bom, essa amiga não tem nome aqui. No decorrer dos acontecimentos, ela só dorme, a bela. Seu papel é mesmo no final - mas não crie muitas expectativas, você pode achar que nem é tão importante assim. 

Além disso, seu nome realmente não interfere em nada com os nossos personagens. Ou com a história. Seu nome realmente não interfere em nada com os nossos personagens. Ou com a história. Então deixemos assim. Personagens sem nome ou passado carregam também consigo um grande mistério. Cool. Por enquanto, ela dorme, profundamente, em sua cama branca, um sono pesado digno de Murakami e suas personagens.


Brooke não morava mais nesse lugar, mas a amiga que a visitava estava se hospedando ali. Meio flutuando, chegou ao quarto para ver se ela ainda estava dormindo. Ao parar à porta, Oliver veio atrás dela e a abraçou.

"Mas talvez haja um lugar onde possamos ficar juntos," ele disse. E sumiu com ela nos braços.

Quando abriu os olhos, Brooke viu que estava em outro mundo. O ar era diferente, a vegetação era mais verde, e todo e qualquer impedimento de se juntar a Oliver realmente havia desaparecido. Assim, num piscar de olhos e de dimensão. Sabia que aquele não era seu mundo, mas ali realmente as restrições que pareciam tão palpáveis na sala da casa de sua mãe haviam desaparecido.

Em férias cinematográficas, eles andaram pelo lugar - uma ilha, na verdade -, nadaram, fizeram trilhas, ficaram juntos. O tempo e o espaço eram outros. Em minutos, viveram uma vida. Sem saber como, se locomoviam para onde desejavam. 



A spark of true happiness that lit their souls. E todo o ambiente ao nosso redor.

Uma felicidade incrível. Brooke de biquini, usava uma canga branca que não escondia muito seu corpo. Continuava gorda, mas ali suas pernas incrivelmente grossas não causavam nada mais que admiração - e não em outros, mas nela mesma, que se impressionou como se sentia à vontade com Oliver ali.

Mas a volta era inevitável. Não me perguntem por que, mas era - afinal, a história é minha, mas não fui eu quem a criei... A felicidade abriu espaço para o desencanto, e os dois se encontravam abraçados e abalados num corredor escuro. Brooke pensava na amiga, que poderia acordar e vê-los assim, desacordados, no quarto da casa de sua mãe. Sem saber como, sabia que eles continuavam lá, imóveis, enquanto suas personas mais livres encontravam-se aqui, despedindo-se desse mundo alternativo que lhes permitira o que seu mundo real lhes recusava.

Outro sumiço e Brooke viu-se novamente na casa da mãe. Abraçados ainda, outra pessoa havia se juntado a eles. A amiga sem nome os abraçava fortemente, e fora ela - Brooke é a rainha dos insights nesta história - que os havia trazido de volta.

E não só isso: ao fazê-lo, como as lágrimas de um conto de fadas, retirara deles todo o estranhamento que, por alguma razão desconhecida, os afastava anteriormente. Neste mundo, como na ilha, estarem juntos era o que fazia sentido. O resto, felizmente, ficara para trás, em alguma dimensão desconhecida. 





Drop Dead Diva é uma série de TV, hoje exibida no Brasil pelo canal pago Sony. É divertidíssima e conta a história de uma modelo linda, querida e fútil que morre, mas consegue voltar - só que no corpo de uma advogada inteligentíssima acima do peso e sem vaidade. 

Conto sobre o seriado somente para situar a personagem de Brooke Elliot, pois essa história não veio de um filme ou livro, mas de um sonho que tive há uma semana. O post tem poucas imagens, porque elas já existem para mim e não consigo traduzi-las em outras imagens. 

O sonho ocorreu mais ou menos como aparece aqui. Mas uma coisa difícil é contar imagens que vieram de uma forma tão forte. Acordei bastante abalada pelo sonho. Tudo era muito determinado e final. E ao tentar escrevê-lo, vi como imagens do sonho são difíceis de narrar. 

Lembrei, falando em sonho e narrativa, de um pensamento de Walter Benjamin, transcrito em Rua de Mão Única (São Paulo: Brasiliense, 1995 - Obras Completas II):

Uma tradição popular adverte contra contar sonhos, pela manhã, em jejum. O homem acordado, nesse estado, permanece ainda, de fato, no círculo de sortilégio do sonho. Ou seja: a ablução chama para dentro da luz apenas a superfície do corpo e suas funções motoras visíveis, enquanto, nas camadas mais profundas, mesmo durante o asseio matinal, a cinzenta penumbra onírica persiste e até se firma, na solidão da primeira hora desperta. Quem receia o contato com o dia, seja por medo aos homens, seja por amor ao recolhimento interior, não quer comer e desdenha o desjejum. Desse modo, evita a quebra entre mundo noturno e diurno. Uma precaução que só se legitima pela queima do sonho em concentrado trabalho matinal, quando não na prece, mas de outro modo conduz a uma mistura de ritmos vitais. Nessa disposição, o relato dos sonhos é fatal, porque o homem, ainda conjurado pela metade ao mundo onírico, o trai em suas palavras e tem de contar com sua vingança. Dito modernamente: trai a si mesmo. Está emancipado da proteção da ingenuidade sonhadora e, ao tocar suas visões oníricas sem sobranceria, se entrega. Pois somente da outra margem, do dia claro, pode o sonho ser interpelado por recordação sobranceira. Esse além do sonho só é alcançável num asseio que é análogo à ablução, contudo inteiramente diferente dela. Passa pelo estômago. Quem está em jejum fala do sonho como se falasse de dentro do sono.

Longe do jejum, já acordado e desperto, o sonho continua a não se sujeitar à narrativa. Ainda fugidio e fiel a si mesmo, permanece em uma dimensão onírica que as minhas palavras, eu sinto, não conseguem alcançar. 

Haruki Murakami, escritor japonês que amo (mais um agradecimento à Rita...), coloca seus personagens em sonhos e mundos oníricos muito legais. A amiga que dorme profundamente poderia ter saído de uma de suas histórias... mas, no sonho, ela é Laura, minha professora e amiga. 

Say nighty-night and kiss me...


O título deste post veio de Dream a Little Dream of Me, que conheci e por ela me apaixonei no filme Surpresas do Coração (French Kiss. Lawrence Kasdan, Uk/USm 1995), um filme de muito impacto para mim. A versão de The Beautiful South, presente na trilha do filme, eu adoro (assim como todo o soundtrack). Mas a versão de Louis Armstrong e Ella Fitzgerald tira os meus pés do chão. Esta eu ia colocar aqui, mas, ao procurá-la, encontrei Zooey Deschanel, duríssima e realmente scary (ooooooooh, adoro também), cantando a minha música. Não consegui resistir, e aqui ela se encontra.